Parti o laço ao invés de afrouxar
o nó. Soltei a mão que tanto me
sustentara ao invés de diminuir o aperto. Larguei a cadeira de rodas antes que
minhas pernas pudessem sustentar tanto peso, ou mesmo os braços tivessem força
para segurar muletas. Em benefício alheio, abri mão do que outrora não
suportaria pensar viver sem, por ter se tornado necessário privar a sanidade alheia
daquilo que nem eu mesma consigo suportar. Esse “Circo do Terror” não precisa de
expectadores.
O conflito me atormenta, ainda que
a decisão já tenha sido tomada. Tão difícil quanto partir de quem se ama é
manter-se erguida e sustentar a situação, dia após dia, falta após falta. Quem
disse que o tempo cura, por favor, venha aqui dizer para as dezenas de marcas que
me rasgam a alma toda noite, pois elas insistem em não me ouvir (aproveita e me
traz uns analgésicos). Não, não é o tempo que cura, mas sim o gelo que se apodera
dos corações flagelados. E eu já posso senti-lo a se aproximar...
Veja bem, meu bem: eu, por nós,
largaria esse inferno e viveria sob tão amado cuidado. Trago, porém, o monstro
circulando em minhas veias como um vírus, e por esse vírus sou obrigada a
partir. Obrigada a deixar-te. Acredite, dói duas vezes mais aqui, mas a dor já
me é familiar. Deixemos que ela fique comigo, por completo, para poupar-lhe de
cicatrizes tão profundas quanto as que, desesperadamente, apresentei-lhe. Já
eu... Livrar-me-ei de todas as dores e mágoas, no meu tempo e do meu jeito, para
que o inferno que nos afasta tenha fim. Esperando que possamos ser novamente apenas
almas entrelaçadas, partirei uma última vez.
Paula Braga.