sábado, 23 de outubro de 2010

Metade



Prefiro dividir teu afeto,
Ocupar apenas as tardes tuas,
E servir de reserva,
A não ser ninguém.


Prefiro um fragmento de riso,
Um só momento de carinho,
E merecer belas palavras,
A viver de lágrimas.


Prefiro a metade ao nada,
O pedaço ao vazio,
O ciúme à tristeza,
A solidão esporádica à permanente.


Prefiro dividir esse pouco tempo,
Mesmo engolindo o ódio e o orgulho,
A dizer adeus mais cedo.


Pois eu agora pertenço inteiramente a você.


Paula Braga.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Conexão



Olhe para mim, e não pisque. Levante o seu olhar, estou esperando. Aliás, há muito eu tenho esperado. Qual é a dificuldade em me encarar? Como se eu não soubesse o que se passa no seu coração... Eu sinto você o tempo todo. Esqueceu que eu te amo? Conheço a sua aura, eu a conheço muito bem. Não há como fugir da nossa conexão.
Pare de se rotular. Evolua. Pra que esse escudo? Pra que essa raiva? Pra que? Não vale a pena ter rancor. Não vale a pena repetir o erro. Somos humanos, falhamos, aprendemos e mudamos. Amadurecer faz parte da nossa existência. Alimente o seu espírito, cresça! Qual é a vantagem do orgulho? Nada, o orgulho não leva a nada. Não aja em função dos outros, não deixe de fazer por medo. Principalmente, não deixe de sentir por medo. Ame, confie, perdoe e aprenda. Baixe a guarda do teu coração. Quem disse que todos querem o teu mal? Sim, tem gente que te magoa, mas tem mais gente que te ama.
Não vale a pena viver solitário por temer a mudança. Livre-se do que não te faz bem, e cultive as coisas boas. Ninguém é feliz sozinho, você precisa do mundo, e o mundo precisa de você.

Paula Braga.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Cárcere



Pelo canto do olho, eu vislumbro o seu sorriso distante. Essa é a minha sina, fui condenada por querer te ver feliz. Não pude te ter, então sacrifiquei o meu amor para que você não fosse embora. Queria que fosse eu a sua amada, mas, mais que isso, eu queria apenas sentir o seu calor perto de mim.
Fracassei. Apostei alto e perdi. Ofertei, por você, o que havia de bom em mim, mas não foi o suficiente. Fechaste os teus olhos ou teus olhos foram fechados? Já não importa mais. Se você esqueceu os bons momentos, eu vou, mais uma vez, completar-te: na minha memória, só quero que fiquem os nossos sorrisos.
Juiz cruel... a sentença é rigorosa. Meu coração está em cárcere, recluso, inatingível. Preso a ti, arrasado sem ti. Paradoxo da dor. Eu não posso viver com você, mas eu não consigo viver sem você. Ainda pulsas aqui, ontem, hoje... Sempre.

Paula Braga.

domingo, 3 de outubro de 2010

Fascínio


 Ela o observava atentamente, enquanto cada célula do seu corpo agradecia por tê-lo consigo. Ela amava o seu sorriso tanto quanto a sua expressão durante o sono. Amava o seu falar tanto quanto o seu silêncio. Amava os cabelos despenteados, o cheiro, o desenho do rosto. Poderia passar o tempo que fosse e ela não perceberia, pois o lento subir e descer daquele adormecido e pálido abdômen consumia toda a sua atenção.
Tão perfeitamente maravilhoso... e estava ali, bem ao seu lado. Era quase inacreditável o fato de ser ela o seu amor. Era o seu sorriso que ele procurava, o seu carinho que o acalmava, as suas palavras que o fascinavam. Ele queria ela e somente ela, enquanto o seu coração batesse.
Algum sonho o agitou, e ele se aconchegou ainda mais perto. Continuava a dormir tão serenamente que ela sequer ousou se mexer. Mas, passado algum tempo, ele acordou. Ela sorriu, e ele retribuiu do jeito que sempre a fazia perder a razão. Passaram alguns segundos se fitando, até que, carinhosamente, ele a beijou. E assim permaneceram, envolvidos um pelo outro, enquanto os primeiros raios de sol iluminavam o seu enlace.

Paula Braga.

sábado, 2 de outubro de 2010

Overdose



Cansei da rotina, da morbidez, do dia-a-dia. Estou saturada de me sentir como um robô, com tarefas a cumprir em cada minuto. Sem descanço, a mesma coisa todo dia. Estou farta de ser apenas um elemento do sistema, uma peça de uma máquina, sem vontade própria.
A aterrorizante palavra que me consome o tempo e os miolos: vestibular. E a vida se resume nisso. Não há tempo para leituras paralelas, para 'curtir' com amigos e família, para o lazer... nem mesmo para desestressar. O saber é importante, prazeroso, mas a rotina de um pré-universitário é um sacrifío. Como já dizia o velho ditado: "tudo demais é veneno". Pois bem, estou envenenada. Overdose de mesmice. Cansei.
Qual é o sentido de tudo isso? Dinheiro? Status? Prêmios? Talvez uma mistura dos três. Mas isso não me sacia, não quero viver de futilidades! Estou com sede de conhecimento, mas de uma forma diferente: o autoconhecimento. Quero descobrir qual é a minha função no mundo, quero fazer a diferença! Estou farta de ser mais uma. Eu quero tempo para ser eu mesma, e mais: eu quero me descobrir.

Paula Braga.

A Ponte


A jovem estava sozinha no banco, e o céu anunciava  a chuva que não tardaria a cair. Eram poucas as pessoas que tinham a coragem de estar fora de casa com aquele tempo, mas a chuva, para ela, era uma dádiva. Sempre fora  considerada criança e ingênua por todos, e mesmo os seus pais estranhavam o fato de ela preferir passar as tardes no banco da praça em vez de ficar em casa vendo TV. Mas, com o tempo, eles se acostumaram, e ela pudera finalmente ficar em paz com a sua solidão. 
Ela não podia ser ingênua sem ser julgada. Não podia ser 'certinha' sem ser ridicularizada. Não podia confiar nas pessoas sem ser reprovada. Vivia em uma sociedade de risos superficiais, festas, bebidas, dinheiro, popularidade, garotos. Tudo isso a atordoava, e muitas vezes ela se via perdida de seus princípios. Era errado, ela sabia. Mas nem sempre ela conseguia se livrar das tentações. 
As primeiras gotas de chuva começaram a cair, tímidas e gélidas. Lentamente, a garota emergiu dos seus próprios pensamentos. Era quase noite, e a rua estava vazia. Ao longe, via-se a ponte da cidade. Ela queria ver o rio de perto, queria sentir junto a si a imensidão da natureza. 
Estava no alto da ponte quando a chuva aumentou. Toda aquela liberdade invadiu o seu espírito, e, como se estivesse esperando por aquele momento durante toda a vida, ela pulou. 
A queda, o vento, a água... e o fio da vida que a separava da plenitude se rompeu. Assim, tornou-se livre e pura. Finalmente, ela estava no seu lugar.

Paula Braga.