domingo, 14 de junho de 2015

Maré


À beira-mar do dia nascente, segurei a tua mão com os dedos firmemente entrelaçados à minha. Nossos pés afundavam na areia molhada enquanto a maré ia e vinha, fazendo a minha mão tremer na tua sempre que a água subia um pouco demais. Eu era inteira embriaguez e sabia que você me acompanhava, o que fazia daquele hiato entre a noite e o amanhecer um fragmento de tempo ainda mais nosso. Eu poderia dizer que o mar cheirava à inocência que a gente tinha entre si, mas eu prefiro guardar enraizado na lembrança algo que era tão real quanto transcendente.
“Um dia eu vou escrever sobre nós.”
Virei a minha cabeça pra ver a tua sobreposta ao rosado do horizonte só para encontrar os teus olhos desviando-se da maré para os meus, e ver você sorrindo com o canto dos lábios daquele jeito que só eu sabia te fazer sorrir. “Sério?” – seu tom de voz parecia ter mais emoção que surpresa. “Sim... Acho que algo singular como o nosso merece ser contado.”
Já se vai um tempo incontável desde que te fiz essa promessa, bem como uma sorte de sentimentos conflitantes e histórias a ser contadas. Mais do que o vai-e-vem do mar que apagou as nossas pegadas ao banhar a areia, páginas do nosso livro foram forçosamente rescritas por algo maior que o meu relato consciente.
Eu queria poder dizer nele que o sentimento de eternidade que eu tinha nos olhos ao pô-los em você ainda ferveria; que a solidão do mundo não pareceria mais tão assustadora enquanto eu visse esse mundo a dois; que ainda existiriam mil praias para se prometer, voluntariamente, aquilo que o coração realmente gostaria de cumprir. Eu queria poder dizer nele que você continuaria provando o que sequer precisava ser dito; que eu continuaria te dando o que sequer precisava ser pedido; que nós continuaríamos encontrando aquele mundo próprio – grande, doce e intimamente nosso. Eu queria pode dizer nele que as minhas mãos ainda procurariam as tuas; que os meus abraços achariam os teus; e que, sobretudo, a minha confiança na inocência se renovaria sempre que em ti pudesse pousar.
Se não fosse a ressaca do mar naquela praia onde fizeram-se tantas promessas, eu poderia escrever tudo isso com o mesmo calor de sentimentos que me bagunçavam e acalmavam em poesia e coração.
E, estranhamente, eu ainda posso.

Paula Braga.

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