sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Diálogo

Essa é uma história sobre anjos.


Ela a abraçou e uma atmosfera de emoção as circundou, quase tangível pelos leigos transeuntes. Tanta mágoa recente e tanta nostalgia, tudo intenso e vívido dentro daquele abraço. Poderia ser eterno, não? Se houvesse uma máquina do tempo, certamente seria aquele o instante para o qual ela voltaria quando, tempos depois, a saudade insistisse em atormentar.
- “Tá tudo bem?”
Era uma pergunta quase retórica, tendo em vista os recentes acontecimentos e a eminente separação. A que ponto haviam chegado, cogitando uma separação...! Anjos não podiam deixar seus protegidos; amigos de verdade não se abandonavam, e ela não podia simplesmente deixá-la. Mas lá estavam as duas, cheias de erros, mágoas e orgulho disfarçado. Vontade de permanecer naquele enlace até que tudo fosse esquecido, como um crime que prescreve. Porém não havia tempo que pudesse apagar, por si só, as novas mágoas; e mesmo que o fizesse, levaria consigo a vivacidade do carinho que guardavam uma pela outra.
Se ela estava bem? Era uma pergunta interessante.. Depois de todas as lágrimas, frustrações e decepções, seria fácil soltar um “não, não tô nada bem” simples e direto, e iniciar ali mesmo uma discussão. Mas, ao contrário do que fora previsto, ela realmente estava se sentindo bem ali, junto dela. Como era fácil confortar um coração desolado apenas com um olhar...  Pena que não bastava, naquele caso. Mesmo assim, ela acenou positivamente com a cabeça, um segundo após a pergunta, sem a mínima vontade de soltar-lhes os braços.
- “Tá tudo bem com a gente?”
E pela primeira vez, naquele dia, ela quis chorar. Quis descarregar todo o medo de perdê-la ali, em forma de lágrimas, para que fosse consolada e tudo acabasse bem. Mas não era simples assim, e envergonhou-se pelo impulso infantil.
A pergunta, porém, desencadeou um turbilhão de incômodos. Alguns adormecidos, como o medo de perdê-la; outros inéditos, como o ciúme. Ao invés de escorrer pelos olhos, no entando, essas inquietações refletiram num aceno de dúvida com os ombros, o que separou aquele abraço e as fez sorrir de desconforto.
Pausa dramática, conversa banal e despedida formal. Ela virou as costas e saiu com passos pesados, levando nos braços o calor alheio e no coração, a vontade de ficar.

Paula Braga.

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